No outro dia, um Padre da Igreja Católica, meu amigo, com trinta e poucos anos telefona-me para fazer uma surpreendente confissão.
O meu primeiro pensamento, juro, foi o de constatar que os papéis estavam invertidos... afinal não é ele que ouve em confissão almas sobressaltadas por dores agudas e espantos demoníacos?
A frase fatal parecia não querer sair... "sou gay! Tenho um relacionamento com um rapaz de vinte e seis anos!"
Arrepiei-me todo! Não por falso pudor, mas porque ouvir da boca de um Padre, que afinal também ele se enrola com outra pessoa em momentos de prazer absoluto e proibido, ainda soa a choque... pelo menos para mim, que ainda fui educado (pasme-se), no mais conservador catolicismo.
"Eu amo-o! Não o quero perder... isto é puro AMOR!"- Mas que amor? E como pode ser puro? E a tua vocação? O Sacerdócio?
Incontáveis perguntas electrificaram-me o cérebro...
- Não te posso responder já... preciso de tempo para reflectir no que me disseste. Quero encontrar respostas... alternativas a esse sofrimento que te devora.
Fiz uma caminhada, li textos Bíblicos, apreciei o pôr do sol e a lua mágica que de noite me iluminava... lembrei a minha meninice e a Freira simpática que me doutrinou. Afinal, ela sempre me falou de um Deus de amor.
Se Deus ama tanto... se Cristo rogou para que nos amássemos uns aos outros, como Ele nos amou, então não podia haver crime pecaminoso nesta relação.
O Amor é o sentimento mais nobre do mundo... é ele que faz girar este planeta na direcção certa (tantas vezes vencido pela guerra, fome, destruição, pobreza...)
Mas e a vocação do meu amigo? Que fazer com o chamamento que ele sentiu quando jovem e que ainda é tão forte?
Pode-se servir a Deus e amar alguém? Mesmo que esse alguém seja do mesmo sexo?
Eu acho que pode...
Há-de haver alguém a latir e a pedir condenação. Já os oiço ao longe, em redor da sacristia:
"Como é que essas mãos conspurcadas ousam abençoar e dar o Corpo Santo do Senhor?"
Mas também oiço Deus, lá do alto:
"Só o Coração limpo Salva! Só o Amor tudo redime!"
AMEN